" Há mais solidão num aeroporto
que num quarto de hotel barato,
antes o atrito que o contato."
(Zeca Baleiro)

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Amar



Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar? amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
Sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso, sozinho,
em rotação universal, senão rodar também, e amar?

Amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto, o que é entrega
ou adoração expectante,
e amar o inóspito,
o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro, e o peito inerte,
e a rua vista em sonho,
e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta, distribuído pelas coisas pérfidas
ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor à procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor,
e na secura nossa, amar a água implícita,
e o beijo tácito, e a sede infinita.



(Carlos Drummond de Andrade)


Destinado a todos os que assim como eu, amam um alguém...
E para aqueles que apreciam a beleza da poesia do Drummond.
.

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